Pesquisadores da Escola de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP, localizada em Pirassununga, desenvolveram um cimento inovador que incorpora fibras vegetais e tem a capacidade de capturar CO₂, reduzindo a pegada de carbono da construção civil. Este novo cimento sustentável pode absorver até 100 kg de CO₂ por metro cúbico de material. Utilizando óxido de magnésio (MgO), ele substitui os compostos tradicionais à base de cálcio, contribuindo para a durabilidade e resistência do material, além de ajudar a mitigar os impactos ambientais da produção de cimento.
Cimento Sustentável e a Captura de CO₂
A principal inovação deste projeto é a substituição do óxido de cálcio por óxido de magnésio (MgO) no processo de fabricação do cimento, o que resulta em um material mais resistente e capaz de capturar o CO₂. A pesquisa visa não só melhorar as propriedades do cimento, mas também ajudar a reduzir as emissões de gases de efeito estufa na indústria de biocombustíveis. No estado de São Paulo, a produção de etanol gera cerca de 11,3 milhões de toneladas de CO₂ anualmente, um dado alarmante que pode ser atenuado com o uso de tecnologias como a proposta neste estudo.
O Impacto do Etanol na Emissão de CO₂ e o Papel das Plantas
O etanol produzido a partir da cana-de-açúcar tem um ciclo de carbono único. Durante sua produção, cerca de 956,5 kg de CO₂ são liberados a cada tonelada de etanol. No entanto, a cana-de-açúcar captura esse CO₂ da atmosfera durante o seu crescimento. Isso significa que, com o uso da biomassa vegetal, parte das emissões de CO₂ da indústria de etanol pode ser compensada. Adriano Azevedo, químico e pesquisador da FZEA, explica que, em um ciclo ideal, as emissões líquidas de CO₂ seriam próximas de zero, tornando o etanol um biocombustível de baixo carbono.
Em 2020, o estado de São Paulo foi responsável por cerca de 45% da produção nacional de etanol, com 14,7 milhões de metros cúbicos de etanol produzidos. Isso gerou 11,3 milhões de toneladas de CO₂. O desenvolvimento de tecnologias para captura de CO₂ pode ser fundamental para a descarbonização da matriz energética do Brasil, tornando o setor de biocombustíveis ainda mais sustentável.
Diferenciais do Cimento Sustentável com Óxido de Magnésio
O cimento inovador proposto neste estudo tem como principal vantagem o uso do óxido de magnésio (MgO), que apresenta um pH mais moderado, entre 10 e 10,5. Isso reduz significativamente o ataque alcalino às fibras vegetais incorporadas, promovendo maior durabilidade e resistência ao material. O cimento tradicional, à base de cálcio, possui pH entre 12,5 e 13, o que acelera a degradação das fibras e compromete a durabilidade do cimento.
+++ LEIA TAMBÉM: Cimento de palhada de milho é destaque
A Captura de CO₂ e Aceleração da Carbonatação
O processo de cura acelerada utilizado no cimento inovador contribui para a captura de CO₂, tornando-o um material ecoeficiente. A carbonatação, que ocorre através da interação entre o CO₂ e os compostos alcalinos presentes na matriz do cimento, resulta na formação de carbonatos de magnésio. Esses produtos secundários preenchem os poros do cimento, aumentando sua densidade, reduzindo a absorção de água e melhorando suas propriedades mecânicas.
Além disso, outros produtos de carbonatação, como nesquehonita, hidromagnesita e dypingite, podem ser formados, dependendo das condições de temperatura, umidade e concentração de CO₂. Esses compostos contribuem não só para a densidade do cimento, mas também para sua estabilidade química a longo prazo.
Próximos Passos: Aumento da Capacidade de Captura de CO₂
Os testes iniciais indicaram que o cimento desenvolvido pode capturar até 100 kg de CO₂ por metro cúbico. Agora, a pesquisa avança para aumentar a taxa de captura de CO₂, modificando as reações químicas do cimento. A próxima fase do estudo envolverá submeter o cimento a um ambiente enriquecido com CO₂ para observar como a formação de carbonatos de magnésio pode ser otimizada, melhorando o desempenho tanto técnico quanto ambiental do material.
Implementação em Larga Escala e Sustentabilidade
A pesquisa também aborda os desafios da escala de produção. Como essa tecnologia é diferente da utilizada na indústria convencional, será necessário adaptar algumas etapas do processo para permitir sua implementação em larga escala. Além disso, um estudo técnico e econômico está sendo realizado para avaliar a viabilidade econômica de utilizar o CO₂ gerado nas usinas de etanol para carbonatar os materiais, promovendo um modelo de negócios sustentável.
Conclusão: Um Passo em Direção à Construção Sustentável
O desenvolvimento desse cimento sustentável com fibras vegetais não só promete melhorar as propriedades do cimento, mas também tem um potencial significativo para contribuir com a redução das emissões de CO₂ na construção civil e no setor de biocombustíveis. Com o apoio da Fapesp e a colaboração de pesquisadores de instituições de renome, como a Universidade de Manchester (Reino Unido), esse projeto pode ser um marco na busca por materiais de construção mais ecoeficientes e sustentáveis.
Fonte: Jornal da USP.